segunda-feira, 8 de setembro de 2008

MANUEL: BANDEIRA DO MODERNISMO

por Enzo Carlo Barrocco

Manuel Carneiro de Souza Bandeira Filho, poeta, cronista, historiador e crítico de artes (Recife 1886 – Rio de janeiro 1968) aos dez anos mudou-se para a então Capital Federal onde foi estudar. Muito cedo contraiu tuberculose, doença que ameaçou sua saúde ao longo de sua vida. Esteve até em Clavadel, cidade suíça, a fim de se tratar da doença. No sanatório em Clavadel conheceu o poeta francês Paul Eluard (St. Denis 1895 – Paris 1952) com o qual manteve contato literário. De volta ao Brasil, Bandeira iniciou sua produção literária em periódicos da época. Publicou seu primeiro livro, “Cinza das Horas”, em 1917. No segundo livro, “Carnaval”, Bandeira evidenciava a busca da simplicidade. Nesse livro figura o célebre ‘Os Sapos’ , poema que foi escolhido pelos promotores da Semana de Arte Moderna como hino do movimento. O poeta foi cognominado pelo também poeta, romancista e ensaísta paulista Mário de Andrade (São Paulo 1893 - Idem 1945) como o “São João Batista do Moderninsmo”. Bandeira conheceu, por essa época os escritores paulistas que em 1922 lançaram o movimento do Modernismo. O poeta colaborou na revista Klaxon e mantinha contato direto com os modernistas. Como crítico de literatura e historiador literário, Bandeira consagrou-se pelo estudo sobre “As Cartas Chilenas” do poeta português, que viveu muito tampo no Brasil, Tomás Antônio Gonzaga (Porto 1744 – Maputo, Moçambique 1810), além do esboço biográfico do poeta, ensaísta e drtamaturgo maranhense Gonçalves Dias (Caxias 1823 - em naufrágio, no baixio dos Atins, MA 1864), além de ter organizado várias antologias de poetas brasileiros. Toda a sua obra foi reunida nos volumes “Poesia e Prosa”, em 1958, contendo estudos críticos e biográficos.
Bandeira é tido como o precursor do Modernismo pelas inovações surpreendentes de seu livro “Carnaval”, de 1919. Entretanto o humor de Bandeira só se desenvolveu em seu quarto livro, “Libertinagem”, de 1930. Nessa obra tornou-se visível a influência da Semana de Arte Moderna de 1922. A produção de Manuel Bandeira vai do simbolismo à poesia concreta, valorizada pela maestria dos versos e o grande poder de síntese. Fiquemos, portanto, com três raríssimas jóias produzidas pelo vasto universo da mente de Bandeira.

RONDÓ DOS CAVALINHOS

Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
Tua beleza, Esmeralda,
Acabou me enlouquecendo.

Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
O sol tão claro lá fora
E em minh´alma — anoitecendo!

Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
Alfonso Reys partindo,
E tanta gente ficando...

Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
A Itália falando grosso,
A Europa se avacalhando...

Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
O Brasil politicando,
Nossa! A poesia morrendo...
O sol tão claro lá fora,
O sol tão claro, Esmeralda,
E em minh´alma — anoitecendo!


TESTAMENTO

O que não tenho e desejo
É que melhor me enriquece.
Tive uns dinheiros — perdi-os...
Tive amores — esqueci-os.
Mas no maior desespero
Rezei: ganhei essa prece.

Vi terras da minha terra.
Por outras terras andei.
Mas o que ficou marcado
No meu olhar fatigado,
Foram terras que inventei.

Gosto muito de crianças:
Não tive um filho de meu.
Um filho!... Não foi de jeito...
Mas trago dentro do peito
Meu filho que não nasceu.

Criou-me, desde eu menino
Para arquiteto meu pai.
Foi-se-me um dia a saúde...
Fiz-me arquiteto? Não pude!
Sou poeta menor, perdoai!
Não faço versos de guerra.
Não faço porque não sei.
Mas num torpedo-suicida
Darei de bom grado a vida
Na luta em que não lutei!

PENSÃO FAMILIAR

Jardim da pensãozinha burguesa.
Gatos espapaçados ao sol.
A tiririca sitia os canteiros chatos.
O sol acaba de crestar as boninas que murcharam.
Os girassóis
amarelos!
resistem.
E as dálias, rechonchudas, plebéias, dominicais.

Um gatinho faz pipi.
Com gestos de garçom de restaurant-Palace
Encobre cuidadosamente a mijadinha.
Sai vibrando com elegância a patinha direita:
— É a única criatura fina na pensãozinha burguesa.

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