sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

A POÉTICA MINEIRA EM BRUNA PIANTINO

Balões

Bruna Piantino
Betim 1978
Poeta mineira

Por não perceberem a gravidade
Milhões de balões de ego
Sobrevivem elevados.

Quanto ao interior
Nenhum gás
Habita mais.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

A BOLSA DO GENIVAL

Miniconto

por Enzo Carlo Barrocco





















O velho Genival era daquelas pessoas desconfiadas e arredias com pessoas estranhas, mas com os conhecidos se tornava falante, ainda mais se estivesse com “duas” na cabeça. Certo dia deixou a bolsa tiracolo no banco comprido da sala do casal de irmãos Nogueira, solteirões convictos, enquanto ia ao igarapé tomar banho. Só Dona Regina, velha solteirona estava na casa. O enfezado Genival voltava do banho quando ouviu o velho Rinaldo, que havia retornado, perguntar: de quem é essa “borsa”? A irmã respondeu: é de “Genivalo” O pessoal da família Nogueira sempre acrescentava “O” no final das palavras terminadas em “L”. Genival, ignorante por toda a vida, apanhou a bolsa e foi embora sem, ao menos, se despedir, resmungando que pela frente o chamavam de “seu” Genival, mas por trás o chamavam apenas de Genival. Os dois velhos estupefatos entreolharam-se enquanto o desfeiteado sumia na curva do caminho.
 

quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

SONETO DE DESASSOSSEGO


ROSÁRIO FUSCO: O POETA ESCALAFOBÉTICO



Rosário Fusco de Souza Guerra (São Geraldo 1910 – Cataguases 1977), poeta, romancista, dramaturgo, ensaísta, jornalista e crítico literário mineiro foi, para muitos, o verdadeiro precursor do realismo fantástico. Rosário era dotado de um humor polêmico e agitado, tendo vivido os seus 67 anos de forma intensa e apaixonada. Integrante do chamado “Movimento Verde”, editou, em 1927 uma revista com o mesmo nome do Movimento juntamente com Enrique Rezende, Guilhermino César, Francisco Inácio Peixoto  e Ascânio Lopes. O modernismo influenciou, sobremaneira, o escritor  que, ao morrer, deixou inúmeros escritos inéditos.


Rosário Fusco
São Geraldo 1910 - Cataguases 1977
Poeta, dramaturgo, romancista e ensaísta mineiro


CARPRICORNEANAS

É no seio
que começa o caminho
do veio,
que fica no meio
do continente,
onde medram florestas (nunca virgens),
odores variados, carúnculas curtidas
em saliva, espasmos inefáveis e
micróbios letais em vinagrete

II

Deita
e não te movas,
Por enquanto,
Deixa que o planeta invente,
por nós,
posições fundadas na hora,
inaugurais e precursoras.
Sem atritos ferozes,
Hiperêmicos,
Mas parcos e sinceros gemidos cavos,
Lubrificaremos os mancais do mundo
Na eternidade de segundos:
- juntos.
(...)


O CANTO NOTURNO DAS ALMAS LIVRES

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

MURILO MENDES: A POESIA SEM PERMEIO

A MÃE DO PRIMEIRO FILHO


Murilo Mendes
(Juiz de Fora 1901 - Lisboa, Portugal 1975)
Poeta minieiro

Carmem fica matutando
no seu corpo já passado.

— Até à volta, meu seio
De mil novecentos e doze.
Adeus, minha perna linda
De mil novecentos e quinze.
Quando eu estava no colégio
Meu corpo era bem diferente.
Quando acabei o namoro
Meu corpo era bem diferente.
Quando um dia me casei
Meu corpo era bem diferente.
Nunca mais eu hei de ver
Meus quadris do ano passado...

A tarde já madurou
E Carmem fica pensando.

terça-feira, 18 de dezembro de 2007

POEMA PARA MARIA

Enzo Carlo Barrocco



Gravura: Nossa Senhora com o Menino (1415-23)
Autor: António Pires de Évora 
 
Tipo: têmpera sobre madeira, com fundo a ouro
Dimensões: 99 x 61 cm
Local: Comuna (Livorno, Itália)


... e Jesus no colo
de Santa Maria
à tarde rósea
sentada ao tamborete de José.

Um anjo alvo se esgueira
à sombra do velho carvalho.
Sobrevoam a tarde
um pássaro azul
dois pássaros azuis
três, quatro...
Maria balança a perna pra Deus não chorar.

A POESIA GENIAL DE JORGE LUÍS BORGES

A CHUVA


Jorge Luís Borges

(Buenos Aires 1899 – Genebra, Suíça, 1986)
Poeta, contista e ensaísta argentino


A tarde bruscamente se aclarou,

porque já cai a chuva minuciosa.

Cai e caiu. A chuva é só uma coisa

que o passado por certo freqüentou.


Quem a escuta cair já recobrou

o tempo em que a fortuna venturosa

uma flor lhe mostrou chamada rosa

e a cor bizarra do que cor tomou.


Esta chuva que treme sobre os vidros

alegrará nuns arrabaldes idos

as negras uvas de uma parra em horto


que não existe mais. A umedecida

tarde me traz a voz, a voz querida

de meu pai que retorna e não é morto.


Tradução: Renato Suttana


LÂMINA E SENTENÇA


ALVARENGA PEIXOTO: O POETA INCONFIDENTE

Inácio José Alvarenga Peixoto, poeta fluminense (Rio de Janeiro 1744 – Ambaca, Angola 1793), estudou no Colégio dos Jesuítas no Rio de Janei...